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Centro de Cultura Libertária da Amazônia - CCLA
Carta das Jornadas Anarquistas Anti-COP
quinta-feira 27 de novembro de 2025, por (CC by-nc-sa)
Todas as versões desta matéria: [français] [Português do Brasil]
Nós, anarquistas do Centro de Cultura Libertária da Amazônia, divulgamos nossa posição acerca da 30° Conferência Mundial sobre Mudanças Climáticas da ONU (COP30), ocorrida em Belém. Compartilhamos a seguir algumas reflexões realizadas durante as Jornadas Anarquistas Anti-COP.
Desde o início consideramos a COP uma farsa em termos de resolução ou mitigação da crise ambiental na qual o capitalismo nos colocou e, como esperado, esta edição da COP nos mostrou isso de várias maneiras. Houve credenciamento recorde de lobistas da indústria dos combustíveis fosseis – foram quase dois mil representantes, comprincipal objetivo de debater meios para a “transição energética” com mais extração e produção de petróleo. Enquanto isso, mais de 40 representantes credenciados dos povos originários foram impedidos de entrar na Zona Azul por não possuírem passaporte - sim, entrar na zona mais restrita da COP foi o mesmo que entrar em outro país.
Durante todo o evento, o Governo Lula divulgou a implantação do TFFF (sigla em inglês para Fundos Florestas Tropicais para Sempre), mais um mecanismo rentista do capitalismo financeiro que passa longe de qualquer solução para os problemas ambientais. Este se alinha à lógica de retroalimentação dos mesmos mecanismos que produziram essa crise ambiental. Para nós é mais do mesmo, sem mudanças significativas nas condições sociais de quem mais sofre com os eventos extremos das alterações climáticas.
Enquanto isso, os povos das florestas seguem sem autodeterminação sobre seus próprios territórios. Não à toa, as duas manifestações que romperam o cerco da segurança das áreas coloridas da COP foram protagonizadas pelos povos originários do médio e baixo Tapajós. Foi uma demonstração da insatisfação com o andamento dos debates que não tocaram em questões cruciais a esses povos, como a garantia de dizer não às empresas do mercado de crédito de carbono, de mineração e garimpo em seus territórios, e de dizer não à privatização dos rios da Amazônia para construção de hidrovias que beneficiará somente latifúndio da monocultura de grãos do agronegócio e a mineração.
A COP reproduz a razão econômica capitalista de ver tudo o que existe, inclusive o ar que respiramos, como moeda de troca. Com essa visão, as soluções só poderiam ser pensadas na lógica da mercadoria. Ironicamente, no dia 20 de novembro, dia de Dandara e Zumbi, um incêndio aconteceu em uma das tendas da Zona Azul, simbolizando um evento extremo das mudanças do clima, queimando a COP.
Por outro lado, as atividades das Jornadas Anarquistas Anti-COP demostraram que outros mundos são possíveis, pela destruição do capitalismo, do Estado, do patriarcado, do racismo, da xenofobia. Foram duas semanas de atividades desde os atos de rua, como a Marcha da Periferia no Dia da Consciência Negra, até debates com companheiras e companheiros de diversas partes do Brasil e de vários países que contribuíram com suas análises, experiências e lutas em várias frentes de resistência contra esse sistema de dominação/controle/exploração, onde em uma avaliação mais ampla, guardando as devidas dimensões no campo cultural e territorial, acabam sendo as mesmas lutas e resistências que travamos aqui na Amazônia.
Essas lutas são atravessadas pelo imperialismo das potências do Norte Global junto com o seu colonialismo e racismo, pela devastação ambiental como resultado da mineração nos países do Sul Global, pela situação de refugiados políticos-climáticos, pela invasão dos territórios dos povos originários e tradicionais, pela especulação imobiliária dos grandes centros populacionais, pelo tráfico de pessoas, principalmente, mulheres; pelo especismo que sustenta a lógica de maltrato de animais para a alimentação humana, pela pobreza / desigualdade social / concentração da riqueza; portanto, algumas das problemáticas as quais foram debatidas, em alguns idiomas e com diversos sotaques.
Cabe lembrar que fazer frente a esse sistema de dominação requer organização, militância, convicção e resistência, mas também música, dança e construção de felicidade. Nas palavras de Emma Goldmam se essa revolução não me permite dançar, então essa não é minha revolução; assim, realizamos um Festival de Arte Libertária, outra forma de dinamizar experiências de luta e resistência por meio da cultura. Contamos com apresentações de vários conjuntos musicais e performances artísticas onde, não obstante, sofremos repressão policial, típico do modo operante desse setor do Estado, subserviente à elite mesquinha que não suporta ver os/as de baixo em suas manifestações culturais.
Entendemos que não há superação desta crise por meio do neoextrativismo do petróleo e da mineração, do neodesenvolvimentismo tecnológico que exige o desperdício de milhões de metros cúbicos de água potável para resfriar os data centers das Big Techs, do monopólio das empresas de energias renováveis como eólica e solar (inclusive esta última exige e incentiva a corrida mineralógica por terras raras), do agronegócio, da privação dos povos de exercer seus direitos de viver em paz em seus territórios, da privatização da água ao ar, da manutenção dos privilégios dos ricos e elites coloniais sustentadas pelas péssimas condições de moradia, pelo analfabetismo, pela fome, pelo genocídio, pela exploração sexual e pela pobreza da maioria das populações, principalmente negras ou racializadas. Não apoiamos e lutamos contra as iniciativas para mitigação dos efeitos das mudanças do clima que não colocam o real problema no centro do debate, ou seja, o capitalismo e seus similares.
Enxergamos nas práticas dos povos originários e tradicionais quem realmente salvaguarda a biodiversidade e as florestas mundiais, quem retira da atmosfera toneladas de dióxido de carbono ajudando a regular o clima e joga para a vala a lógica rentista do crédito de carbono. Isto, associado às lutas e resistências travadas pelas populações pobres do campo e da cidade espalhadas de norte a sul, e de leste a oeste do mapa global, mesmo com muita humilhação e dificuldade para garantir a conquista do pão, da tortilha, do chapati ou do beiju, se reinventam pelo apoio mutuo e solidariedade quando veem suas vidas sendo atravessadas pelos eventos climáticos extremos, produzidos pela ganância e pelo lucro dos ricos. A COP não tem resolução para os nossos problemas, muito pelo contrário, é um organismo criado para a gestão da crise ambiental, firmado pelos mesmos setores que fazem a gestão da fome e da pobreza mundial. Assim, nossas urgências não cabem na COP. As soluções à crise climática-ambiental-social já existem, agora você e nós sabemos quais são e o que devemos fazer.
| História do anarcossindicalismo italiano - Brochura - PDF |
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